domingo, 17 de outubro de 2010

Perguntas


15h56min.
Passos nas escadas. Ecos de conversas nos corredores. E milhares de perguntas. Paro, mordendo o lábio inferior. Entro? Vou embora? Entro? Vou embora? Arrumo minha mochila no ombro direito, me sentindo desconfortável. Por que estou parada aqui? O corredor está vazio, não tenho vontade nenhuma de entrar e ninguém me impedirá se eu retroceder o caminho e voltar pela mesma porta que entrei. Então, por que hesito em ir? Culpa?
Porém, o que mais posso perder que já não tenha perdido?
Tantas perguntas e somente uma resposta para todas. Me dirijo até a porta tomada pela súbita decisão de enfrentar qualquer coisa naquele momento... até que olho pela janela e o encontro, encarando a tela do celular. Retrocedo. Não tenho vontade de ter nem uma pergunta respondida.
Vou embora, decido. Quer dizer, quais motivos tenho eu para entrar naquela sala? Nenhum, além de masoquismo. Não é exatamente como ir ao dentista; atrás daquela porta não há nenhuma compensação como dentes perfeitos pós-tratamento ou pirulitos depois de uma obturação. Há apenas submissão... e palavras murmuradas em voz baixa enquanto olhos castanhos impetuosos riem de mim por dentro.
Giro nos calcanhares, dando de cara com um dos coadjuvantes do show de meu algoz semanal. Merda. Desvio os olhos, murmurando um cumprimento mais parecido com um bufo e fazendo um desvio rápido da porta de saída para o banheiro feminino. Ele me responde com um sorriso meio intrigado, mas entra na sala sem se importar comigo. Como eu queria poder fazer o mesmo.
15h58min.
Dentro do banheiro, molho meu rosto. E procuro respostas nas bordas do espelho.
Bem, minha estratégia de sair de fininho já estava estragada por causa da chegada do Senhor Tranquilidade. Não que eu ainda não pudesse ir embora – duvidava muito que aquele cara contasse para qualquer um que me vira do lado de fora e tampouco me importava se ele me achasse louca. Minha falta de fama ali (ou melhor, má fama) era um dos raros motivos que me deixavam alegre, já que não precisava me importar com o que os outros poderiam pensar.
Mas a verdade é que eu não queria admitir minha derrota e covardia indo embora. Mesmo que ninguém soubesse da minha luta interna, eu não queria admitir que fora fraca por não conseguir mergulhar nos olhos âmbar dele e lutar contra a correnteza.
Não queria admitir o fato de ficar sem reação quando ele se dirigia sarcástico a mim. Não queria me sentir incomodada com sua presença em tudo perfeita. Não queria prender a respiração ao sentir seu perfume cítrico. Muito menos ter apenas uma resposta dele para todas minhas indagações.
E, principalmente, não queria admitir o fato do quanto ele poderia me fazer mal.
E do quanto ele realmente fazia.
16h06min.
A maçaneta do banheiro mexeu do lado de fora brutalmente, afogando minhas esperanças de ir embora privada à baixo e me dando tantas respostas quanto ele.
E é assim que resolvo tomar minha dose de dúvidas semanal.
Abro a porta da sala rapidamente e afundo em meu lugar, tentando não chamar atenção, pensando se com isso posso conter os danos ou ao menos manter minha sanidade.
Mas meu pedido é dissolvido pela voz dele, como sempre.
“Someone hates you in this class.”
“What?”, eu pergunto de guarda baixa, como sempre acontece quando estou com ele. E é a última coisa que digo.
Muito mais tarde, perceberia que naquela hora, como em nenhuma outra antes, ele teria me falado a verdade se eu tivesse feito a pergunta certa. Eu poderia ter perguntado o por quê. Ou quem. Poderia até mesmo ter perguntado quando tudo se transformara em ódio. E ele teria me respondido. Mas ele sempre fora como uma esfinge, mas que ao invés de fazer perguntas, dava apenas uma resposta quando o que ele guardava estava ameaçado. E eu tinha tantas perguntas...! Sim, eu ainda poderia ter perguntado: “O que em você está sendo ameaçado?”. Eu poderia ter implorado isso ou perguntado quaisquer dessas questões, mas com aquele inútil “o quê?” eu acabara esgotando minha cota. E quando seus olhos castanhos faíscam e se desviam dos meus, já é tarde demais.
“Nothing. You’re late again.”
E sei que ele não responderá mais nenhuma de minhas perguntas, não importa em qual língua, por um bom tempo.
E é nesse momento que penso que talvez, um talvez meio improvável, eu sei, mas que talvez sejam todas as minhas perguntas a serem respondidas que o deixem ameaçado.

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